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02 de Abril de 2007

Comportamentos éticos nas organizações, são urgentes e necessários. Não faltam discursos, há carência de boas práticas. O caminho é longo e a estrada é larga – o futuro constrói-se a andar.

I. Os problemas da empresa têm duas dimensões distintas: a tecno-económica e a socio-política. E em ambas a ética é espírito e fundação. Com lugar natural na definição da missão da empresa, donde decorrem as finalidades e os valores partilhados. A ética da empresa nasce, reside e afirma-se nas ideias e nos actos concretos dos parceiros em presença, do topo à base. Constitui uma necessidade objectiva – por razões de responsabilidade institucional, para que se possam prosseguir finalidades e alcançar objectivos traçados e por motivos de aprendizagem e inserção social. São valores morais, hábitos, costumes positivos, que se assimilam e integram e têm como finalidade intervir de forma útil na sociedade, actuando para modificar para melhor os comportamentos que devem ser mudados.

II. A ética não é um conjunto de crenças, nem se resume a consensos políticos eventualmente negociáveis. Um código ético não precisa de ser escrito para existir. A carta de compromisso ético que algumas empresas impõem aos seus colaboradores (e mesmo aos seus clientes e fornecedores) não é garantia de nada – seja por parte de quem a emite, seja de quem a subscreve. O quadro de conveniências e interesses introduz inevitavelmente um certo grau de insegurança e hipocrisia no ambiente relacional.

III. Quando existe – escrito ou não escrito, mas evidentemente assumido – o código ético é uma ferramenta estratégica poderosa, que exige saber e competência no exercício da gestão. Serve para exprimir a identidade e a razão de ser, para explicar o que queremos ser e quais as nossas finalidades, para reforçar os comportamentos positivos, para resolver dilemas e gerar auto regulação, para assumir compromissos fundamentais (como queremos fazer, para fazer bem) e para proporcionar credibilidade. O código ético deve abordar, na perspectiva da empresa, o quadro geral de relações – com os colaboradores, com os clientes e com os mercados e mesmo com os accionistas. Também com os concorrentes e, de um modo geral, com a comunidade em que a empresa exerce influência institucional.

IV. Os limites éticos, em Portugal, devem inscrever-se e aperfeiçoar-se no quadro da evolução qualitativa da economia e da sociedade. Não são as normas que os determinam, são as boas práticas. A over-regulation típica das multinacionais americanas, não é exemplo a seguir por não corresponder a um quadro cultural sinceramente aceitável. Existem outras vias que podemos trilhar. A retomada dos valor dos princípios e da palavra dada, da confiança mútua e da preservação do valor, da continuidade nas relações de mercado e do equilíbrio de interesses das partes, são questões de mais-valia para as quais devemos culturalmente orientar-nos – nos negócios e nas relações de e com o estado. E certamente nas escolas de ciências empresariais.

V. O esclarecimento de uma sociedade afirma-se mais pela qualidade da ‘procura’ do que pelo nível da ‘oferta’. A ética social forma a base para uma massa crítica do lado da ‘procura’ e para a formação de um estilo de sociedade capaz de mudar o que está errado na ‘oferta’. Cabe aos dirigentes – públicos e privados – assumir as responsabilidades neste quadro. Por razões diversas, que vão da responsabilidade institucional à preservação e protecção do meio, à consciência crescente da auto regulação e à mudança inevitável dos paradigmas sociais, o poder dos stakeholders (a sociedade correlacionada) tende a sobrepor-se (inclusive no âmbito da decisão estratégica) à vontade dos stockholders (os accionistas) cujos interesses são económica e financeiramente determinados. Neste espaço de aparentes contradições, o domínio dos valores éticos afirma-se em pleno e revela-se essencial.

VI. Nas sociedades desenvolvidas, o homem é o centro e a medida das coisas. A realidade é antropocêntrica e a liberdade serve para cada um se assumir com visão estratégica, optando pelo estilo de vida, pela organização social e pelas prioridades que mais lhe convenham, prestando o seu trabalho com consciência de interesses e buscando realização na procura dos bens e serviços que mais o beneficiem. Referências éticas para um modelo digno e estável de vida, de futuro e de sociedade, procuram-se activamente em Portugal.

VII. O mundo em que vivemos precisa de recuperar – a consciência de si, a auto confiança e o optimismo – e os cidadãos que desejam ser, além de prósperos, verdadeiramente livres, terão que se orientar para uma cultura de conhecimento responsável, para uma moral de trabalho e solidariedade e para uma visão da vida com amanhã.

A ética é a grande questão subjacente para que se afirmem, na sociedade e nas empresas, o primado do saber, a coragem de ser, a determinação de viver cada dia e a esperança para continuar.

Carlos Saraiva Alves

Docente do ISG

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