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22 Setembro de 2009

Avelino de Jesus

Os problemas prementes da economia portuguesa – o pesado endividamento externo e o incipiente crescimento do produto – têm estado quase ausentes no presente debate eleitoral.

As soluções daqueles dois problemas remetem, no essencial, para o aumento da poupança (o endividamento externo) e da produtividade (o crescimento do produto). Não tardará muito que nos batam à porta e nos obriguem a apertar o cinto; a questão do endividamento resolver-se-á por si, sem grandes exigências de reflexão das nossas elites.

Porém, na questão da produtividade o país vai ficar sozinho: nenhuma solução virá de fora.

Como já referi nesta coluna, existe um conjunto pesado de constrangimentos ao crescimento do país. Alguns, de natureza geográfica, são inultrapassáveis. Outros, susceptíveis de controle – como o peso asfixiante do Estado e a rigidez das relações laborais – têm sido alimentados por um conservadorismo político e social extremos atravessando a generalidade das formações políticas.

Portugal conheceu no século 20 dois períodos de convergência franca com a Europa: primeiro, a década de 60 e início da de 70 e, segundo, o período de 15 anos a seguir à última metade da década de 1980. Nestes dois períodos o país convergiu devido a choques externos que arrastaram a abertura do país ao estrangeiro, a redução do peso do Estado, e o investimento privado. O primeiro choque correspondeu á entrada na EFTA e à guerra em África; o segundo á entrada na União Europeia. Não tendo o país procedido às mudanças internas necessárias, o efeito dos os dois choques externos esgotou-se.

Hoje, não sendo expectável um novo choque externo, as variáveis que verdadeiramente poderão fazer descolar a nossa produtividade são a flexibilidade do mercado do trabalho e a redução da carga burocrática que pesa sobre o licenciamento das actividades económicas.

Infelizmente não parece haver entre nós uma consciência clara de dois factos:

  1. Da importância destas duas variáveis para o aumento da produtividade;
  2. Do atraso esmagador que o país regista, quer quanto aos níveis actuais de produtividade, quer quanto aos indicadores representativos das referidas variáveis.

O problema mais importante são os factores de entrave aos crescimento das PME. Verificamos na economia portuguesa uma reduzida presença de grandes empresas. Por outro lado, a produtividade nas grandes empresas é em geral cerca do dobro da das PME, podendo chegar, nalguns casos, atingir valores de 6 para 1. O crescimento da produtividade não poderá fazer-se sem um substancial aumento da dimensão média das nossas empresas.

Muitos decisores menos informados tendem a minimizar a importância da rigidez do mercado de trabalho e da carga burocrática, provavelmente porque, tendo experiência em grandes organizações, beneficiaram da capacidade destas para contornar e beneficiar das regras existentes.

Sendo Portugal o pais com a maior rigidez na área das relações individuais com os empregados permanentes, regista, porém, no âmbito dos despedimentos colectivos, o regime mais liberal de todos.

Tem havido, provavelmente com boas intenções, um enfoque das políticas económicas em objectivos errados, nomeadamente, procurando promover o empreendedorismo e proteger a actividade em certos sectores específicos. Ao contrário do que parece – a dar crédito aos programas da generalidade dos partidos e à proliferação de iniciativas para promover o empreendedorismo – o país não regista carência de iniciativa empresarial. A taxa de nascimento de empresas era, em 2005/2006 em média , de 10% na União Europeia, enquanto Portugal regista a taxa de 14%, sendo a 3ª mais elevada da área. Por sua vez, a taxa de mortalidade é a mais elevada: 14,2 %, contra a média da UE de 8,5 %. Portugal é um dos 3 países (ao lado da Hungria e da República Checa) onde a mortalidade é superior à natalidade.

As PME carecem de contexto para a sua sobrevivência e crescimento. Existe uma formidável vontade de empreender – atestada pela elevada taxa de natalidade empresarial – que é derrotada por obstáculos gerados pelo processo político, como se pode notar pela igualmente elevada taxa de mortalidade das empresas. A rigidez no mercado de trabalho tem impacto negativo sobre concorrência no mercado de produtos: protege as empresas ineficientes, as quais – ficando mais tempo no mercado por não responderem adequadamente às variações dos custos – não ganham a mobilidade e agilidade necessárias às novas exigências da procura. Do mesmo modo, aquela rigidez dificulta a introdução de novas tecnologias – ao não permitir a reafectação rápida da força de trabalho aos novos processos e produtos.

As recomendações que resultam desta análise não são populares e fazem apelo a decisões dolorosas. Elas constituem, na próxima década, um choque inevitável numa improvável, mas possível, descolagem do crescimento da economia portuguesa.

Avelino de Jesus Director do ISG –Instituto Superior de Gestão majesus@isg.pt

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