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Importa não esquecer que se o par de sapatos português é o segundo mais caro do mundo não se deve certamente na totalidade às suas fábricas mas sim ao design, à atividade comercial e a muitas relações públicas. É nisto que temos de nos focar.

No filme “O Fundamentalista Relutante”, a personagem principal, professor universitário no Paquistão confirmava aos seus alunos que a América, onde estudara (em Princeton) e trabalhara (numa consultora financeira), era de facto, a terra das oportunidades e perguntava-lhes que epíteto poderia ser atribuído ao Paquistão. O filme não nos dá respostas, mas fez-me pensar que a mesma pergunta, sobre o que pode Portugal representar para os seus cidadãos (nascidos ou migrados), não apresentaria também uma resposta clara e inequívoca. Temos tido em primeiro lugar uma descoordenação de comunicação e temos um péssimo hábito de nos substituirmos aos nossos adversários dizendo mal de nós próprios. Como nação somos críticos de um conceito de portugueses onde nunca nos incluímos. São sempre “eles”, os “outros” os responsáveis pela suposta incapacidade do País em porfiar. Usamos o “Europe’s West Coast” ou o “Allgarve” como símbolos de subserviência aos anglo-saxões. Achamos brejeiro o galo de Barcelos (cada vez menos é certo, por via da dinâmica artística), que os estrangeiros nunca prescindem de comprar.

Isto tudo a propósito do dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas. Nestes tempos conturbados, os poderes políticos nacionais perdem boas oportunidades de reforçarem os valores que nos podem marcar no espaço mundial. Não é necessariamente o país que representa a terra das oportunidades, mas somos com certeza um povo que não renega as mesmas e que faz das dificuldades as ditas oportunidades. E continuando o espaço mediático e de opinião pública a ser tomado pelo tratamento menos positivo dado à realidade da emigração, era nestas alturas que Presidente da República e membros do Governo deveriam deslocar-se ao seio das comunidades lusas no estrangeiro, reforçando os laços e agradecendo-lhes aquilo que fazem em prol da imagem de Portugal e dos Portugueses. Triste é ver que dos tantos condecorados pelo Presidente da República no 10 de Junho, só um representava as Comunidades Portuguesas (de Macau).

O 10 de Junho deve ser analisado historicamente face às intenções que nas diversas alturas estavam por detrás das mentes que nos governavam. A referência às Comunidades Portuguesas surge em 1978 caindo, e bem, a referência à Raça. São as Comunidades Portuguesas, espalhadas pelo Mundo que têm algumas das sementes necessárias àquilo que necessitamos: investimento, credibilidade e capacidade de trabalho.

Pois bem, no discurso do Presidente da República de 12 de Junho no Parlamento Europeu, que sucedeu ao discurso de 10 de Junho1 foram feitas associações à “marca do diálogo atlântico”, ao “universalismo da sua língua e da sua cultura”, aos “laços especiais de amizade com África e a América Latina” à “diáspora” e tudo consolidado numa referência à importância de Portugal para a própria imagem de Europa. Mas depois cai numa das modas da atualidade: os bens transacionáveis, ligados às exportações. A esta preferência atual pelo material ao invés do imaterial (que pena o Presidente ter deixado cair a sua defesa das indústrias criativas) classifico de incompreensível porque está ligada a uma fixação generalizada pelo modelo de desenvolvimento alemão. Poderei ser contrariado se me disserem que o Presidente se refere a um caminho de transformação de bens não transacionáveis para transacionáveis2 como tenho vindo a defender, por exemplo, com a educação. Mas não, na formação clássica do nosso Presidente há um regresso ao fabril (e agora até à agricultura) e ao extrativo, esquecendo as nossas grandes capacidades comerciais (foi isso que sustentou as nossas Descobertas). Importa não esquecer que se o par de sapatos português é o segundo mais caro do mundo não se deve certamente na totalidade às suas fábricas mas sim ao design, à atividade comercial e a muitas relações públicas. É nisto que temos de nos focar. Para que sejamos reconhecidos como um Povo que aproveita oportunidades e que lhes acrescenta valor.

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