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todas as noites quando me deito,

penso um pensamento cobarde:

que eu morra durante o sono (…)

(Herberto Helder; “Letra Aberta”; 2016; p.17)

 

Em setembro de 2014 escrevi neste jornal um artigo com o mesmo título do presente  e que convido a (re)ler. No entretanto a coisa em geral agravou-se e a conclusão a que se chega é que de facto, sem capital, todos os cenários e possibilidades de concretização das condições que permitam um crescimento sustentado da economia nacional com uma consequente redução do défice público (e obrigatório foco na criação de excedente orçamental) são inexequíveis. Alinhado com este pensamento, não posso deixar de citar um dos meus Professores mais queridos na Universidade, Prof. João César das Neves, que consistentemente gera amores e ódios e que na sua coluna semanal comenta uma entrevista que também tive o prazer de ler de José Maria Ricciardi ao Expresso de 25 de março . No artigo “Dinheiro não é capital” reforça-se esta realidade, da inexistência de uma cultura atual de poupança por parte dos cidadãos e que é este facto que impede a existência de capital suficiente para alimentar um sistema que permita um chamado ciclo virtuoso de capitalização das instituições. Uma das frases mais marcantes do artigo é a de que “agora temos um governo que não gosta do capital, mas já antes não havia”. Ora esta realidade e a ilusão que ainda agora foi mantida que através dos fundos comunitários se conseguirá melhorar os rácios de capital das empresas falha porque estes são normalmente facilitadores e catalisadores de algo que manifestamente não existe. 

Independentemente destas dificuldades, tenho-me permitido fazer nesta coluna um conjunto de possíveis soluções que acredito serem um caminho para a melhoria de diversos aspetos da economia nacional. E reforço hoje esta noção com um conjunto de ideias que passo a explanar de forma concisa e que, no caso em apreço, permitiriam melhorar os rácios de capital das instituições nacionais:

1.Acabar com a noção de instituições com ou sem fins lucrativos, permitindo modelos híbridos de investimento em capital nas entidades do sector social (com uma tendência crescente) e permitir entradas de capital nestas por parte de entidades com fins lucrativos; promover legislação que permita alterações estatutárias que conduzam por exemplo que Cooperativas possam ter fins lucrativos ou ser mesmo transformadas em sociedades comerciais se a maioria dos cooperadores assim o desejar e votar;

2.Não tributar lucros, exceto quando distribuídos (e se o forem em menos de 7 a 10 anos);

3.Promover a transformação de créditos em capital com benefícios fiscais (permitindo a recuperação de IVA, a renovação de prazo de recuperação de perdas associadas em sede de IRC, a concessão benefícios imediatos na alienação de capital a SGPS, Fundos ou capitais de risco);

4.Renovar os momentos de repatriamento real de capitais (e não o que foi feito em 2012 através do Regime Excecional de Regularização Tributária (RERT) que a tal não o obrigava);

5.Recuperar os estudos feitos sobre a criação de Trusts (Fundos patrimoniais) pelo Ministro Teixeira dos Santos quando era Ministro da Finanças – pois sem um modelo que proteja o capital (seja por via dos próprios detentores do Trust seja de futuros credores) quem cria estes modelos continuará a fazê-lo fora do país;

6.Chamar por exemplo as empresas do PSI 20 que utilizam SGPS em países terceiros (como a Holanda) e perguntar-lhes o que necessitam para transferir as mesmas para Portugal e estar disposto a pagar pela tributação adicional que eventualmente tenha de ser paga no país de onde saírem;

7.Alargar a possibilidade de contabilização de impostos diferidos em contas de capital desde que estes ganhos não sejam distribuíveis e alargando o prazo de recuperação dos prejuízos fiscais.

São ideia em que acredito. Sei que o discurso anti capitalismo é permanente (e não só a nível dos políticos) mas acreditem todos os que me leem – a tratar o capital desta forma o turnaround que se deseja não acontecerá tão depressa e não será certamente um Estado capitalista (como e com que dinheiro?) que irá resolver este problema.

De manhã quando acordo – que decepção! – não estou morto (…)

(Herberto Helder; “Letra Aberta”; 2016; p.36)

Carlos Vieira

Administrador ISG

(Artigo escrito de acordo com o mais recente acordo ortográfico)

 

 

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