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A reforma da Segurança Social é um tema muito sensível e constantemente adiado pelos sucessivos governos, que hesitam em discutir o assunto. Mais do que uma discussão ideológica, trata-sobretudo de um problema matemático de sustentabilidade. O modelo de providência que serviu de base à construção europeia foi ultrapassado pela realidade social, em especial a evolução demográfica das últimas décadas.

Recentemente, numa entrevista, o Ministro Vieira da Silva mostrou-se a favor da eliminação do limite de 70 anos para trabalhar no Estado com o argumento da escassez de qualificações e também do direito ao trabalho.

Fiquei confuso com tal argumentação. Em primeiro lugar, nunca existiu em Portugal, uma população ativa tão qualificada como nos últimos anos, tanto a nível académico como a nível das profissões. Em segundo lugar, se foi uma conquista da renovação de gerações e de quadros limitar a 70 anos a idade de trabalhar para o Estado, então o Ministro não acredita nos jovens nem valoriza o facto de o Estado ter que pagar Reforma e Ordenado à mesma pessoa após os 70 anos, nem o encargo que isso representa para os contribuintes.

Claro que esta realidade interessa muito a quem busca as prateleiras douradas, em que o Estado se especializou em oferecer. O Estado tem a obrigação de impedir que o interesse particular não se sobreponha ao interesse público. O dinheiro é dos contribuintes e como é de todos é muitas vezes tratado como se fosse de ninguém

Ora, se alguém opta pela reforma ou se se vê obrigado pela idade a reformar-se, poderá sempre optar por voluntariado em prol do “envelhecimento ativo”, libertando espaço para o emprego jovem. Mas como “dá trabalho” e não se vislumbram prateleiras douradas, os potenciais interessados desaparecem e já preferem gozar a reforma.

Vou até mais longe, pois a limitação de trabalhar só até aos 70 anos não deveria ser apenas no Estado mas também no privado. Seria a melhor política de renovação de gerações e de incentivo ao emprego jovem, que parece não ser prioritário. A reforma nunca deve ser compatível com trabalho remunerado.

O direito ao trabalho é tão legítimo como o direito à reforma e ao descanso. Também é tão legítimo o direito ao trabalho aos 20, aos 30, aos 40, aos 50, aos 60 anos. Também com a garantia da reforma, é legítimo o direito ao voluntariado, o que é socialmente útil, nobre e desafiante.

Felizmente, de acordo com as estatísticas oficiais do INE são cada vez menos as pessoas que trabalham após os 65 anos de idade. Aliás esta visão do Ministro, que em tudo me surpreende, vem contra a medida “contrato-geração” patente programa do Governo e que procura combinar um estímulo para as empresas contratarem jovens e ao mesmo tempo, facilitar transições para a reforma.

Entretanto, vai “envelhecendo passivamente” o sistema de Segurança Social sem reforma à vista..

A experiência acumulada numa vida de trabalho deve ser respeitada e tem valor. Também em cargos políticos, obviamente abertos num sistema democrático a todos os cidadãos maiores de idade, se exercidos depois dos 70 ou por reformados de idade inferior, deveriam ser em regime de voluntariado.

Reduzia-se o leque de escolha, mas tenho a certeza de que teríamos ótimos governantes, de entre os que se apresentariam.

 

Artigo publicado no jornal negócios de 17/03/2017

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