«Os debates eleitorais que temos assistido na comunicação social, com especial destaque para as autarquias de maior dimensão do País, têm incidido maioritariamente sobre os temas da habitação, do turismo, da mobilidade e dos transportes, temas esses que, pela sua elevada importância podem pesar bastante nas intenções de voto dos cidadãos locais.
Mesmo correndo o risco de ser demasiado simplista na análise geral dos candidatos das principais autarquias, concluímos que, de uma forma geral todos defendem mais habitação, mais turismo, mais e melhor mobilidade e transporte, ou seja, todos apostam no aumento populacional, entre habitantes e turistas.
O que torna tudo verdadeiramente estranho é que o pensamento subjacente às medidas preconizadas pelos candidatos que apresentaram os seus programas e argumentos na comunicação social vai no sentido de considerarem que o cidadão urbano tem um comportamento bidimensional, ou seja, habita e desloca-se e que tudo o resto tem pouca relevância para a vida urbana.
Fica, assim, perfeitamente esquecida a vertente do consumo e consequente abastecimento de produtos aos milhares de estabelecimentos comerciais, tão necessários à fixação dos residentes urbanos e à promoção do turismo. Por isso, qualquer medida proposta com impacto direto na mobilidade urbana, deve ter subjacente uma análise das possíveis condicionantes aos fluxos físicos de mercadorias das zonas abrangidas, porque “para criar valor com sucesso, é preciso entregar valor com sucesso” (Marketing Management, 2005 Prentice Hall).
Neste caso, e sem querer fazer as delícias de Frederick Taylor, a medicação é fundamental para poder gerir. Saber a dimensão da frota comercial, a sua tipologia, o número de viagens, os horários de distribuição e recolha, as características das mercadorias e os tipos de embalagem, o tempo médio de viagem, as restrições de estacionamento e os tempos médios de tráfego, entre outros, constituem elementos fundamentais para a tomada de decisão sobre planeamento urbano e sobre as políticas de mobilidade.
De facto, o desconhecimento sobre o mundo da logística urbana é, de forma generalizada, muito grande. A tomada de decisão sobre estas matérias assenta, muitas vezes, em dados empíricos. Por exemplo, se estivermos a falar sobre transportes de mercadorias urbanos e quisermos saber o peso que este tem nas viagens urbanas, o que existe são diversos estudos empíricos que apontam o valor de 6 a 18% do total das viagens urbanas.
Por outro lado, não é tido em conta o fator negócio/empresa e que é um dos principais motores da logística urbana. As empresas para maximizarem as suas vendas, utilizam diversos canais de distribuição em simultâneo para chegar ao maior número de pontos de compra, por forma a garantir elevados níveis de rotação dos produtos nas prateleiras ou balcões. O incremento de vendas é assim assegurado pela maior visibilidade e disponibilidade dos produtos.
Para a autorização de abertura de um estabelecimento comercial como, por exemplo, um restaurante, são tidos em linha de conta, critérios relacionados com o seu abastecimento e de logística inversa? É sabido que parte significativa dos problemas de tráfego seria resolvida com um adequado planeamento urbano.
O que importa reter e em jeito de conclusão é que medidas e políticas conducentes ao incremento da habitação, turismo, educação, saúde, entre outros, têm como consequência o aumento da procura de bens e serviços, onde o transporte de mercadorias se assume como um fator-chave na cadeia de abastecimento urbano. Por isso, é fundamental que a logística urbana venha para a luz do debate dado que a sua eficaz implementação exige compromissos políticos com os vários atores, públicos e privados.»
Mestre Paulo Pereira, Docente da Pós-Graduação em Logística e Gestão de Operações do ISG | Business & Economics School