Select Page

Vencer o medo

10 de Maio, 2019

Li o que Bruno Bobone disse há dias: o português tem medo de tudo. Li a entrevista[1] na sua totalidade e louvo a audácia de ele dizer, com o desassombro de quem nasceu em África, sem remoques, que “em África, não se pode ter medo. Quem tiver medo morre”.

Já há alguns bons anos que tenho essa perceção e que trabalho para superar o medo. Generalizando, nós, portugueses, somos, de facto, uns medrosos. E isso revela-se no nosso dia-a-dia. E até nas estatísticas – veja-se o estudo 2019 Global Emotions Report[2], da Gallup, que analisa 143 países e que consegue colocar Portugal no 5.º lugar dos mais “preocupados” (ou seja, que responderam que no dia anterior experimentaram sensações de elevada preocupação) do Mundo, a seguir a Moçambique, Chade, Benim e Irão e acima do Camboja, Níger, Togo e Brasil.

E esta preocupação e medo transmite-se de pais e de professores para filhos e alunos. E ainda bem que vieram, em quantidade e qualidade, muitos retornados aquando do regresso das antigas colónias. O que seria deste cantinho sem essa dinâmica (veja-se a quantidade de líderes empresariais e políticos nascidos em África!).

Tive a sorte de a referida entrevista ter sido publicada num dia em que eu dava aulas de Gestão Financeira a alunos do ISG, e em que um dos temas era análise de investimentos. A certa altura, no debate, referi-lhes que tão fundamental como um empreendedor ser um criador (na instalação de um negócio ou na dinamização de projetos dentro de organizações, lucrativas ou de âmbito solidário ou associativo) era perceber qual o momento de sair, se a coisa não estivesse a correr bem. E alguns alunos referiram que sentem que, quando a alguém um negócio não corre bem, é altamente estigmatizado, contrariamente ao que ocorre em outros países, em que se entende que o efeito aprendizagem e correção de eventuais falhas serve para construir uma história de vida que, obviamente, terá vitórias e insucessos (e “coisas” neutras….).

Agora que escrevo, lembro-me dos últimos tempos que tenho vivido, em que muitos me aconselham a ficar calado. Que os ataques que por aí grassam não me são dirigidos, mas sim a outros. Que se eu falar muito me irão perseguir ainda mais. E dizem-me: “estás a ver? Falas e levaste com mais nove meses de suspensão de sócio do Sporting”. Já vou ter de cumprir quase dois anos entre duas suspensões de dez e nove meses, adicionadas a períodos temporários que não relevam para efeitos de contagem. E sabe-se lá que mais. Pois, mas sinto que o melhor que fiz, e que iniciei num texto que o Link to Leaders me permitiu publicar, foi esclarecer as pessoas que são alvo de permanente desinformação e intoxicação mediática sobre o que foi o meu trabalho e dos meus colegas. Julgo que cumpri esse desiderato e continuarei, sempre que necessário, a fazê-lo.

Pois. Também me lembro quando em 2011 e 2013 também me disseram para não me meter em eleições no Sporting. Que eu e os outros éramos loucos. Pois éramos. E fizemo-lo por paixão, com dedicação e com algum desapego a vidas, porventura, confortáveis. Como outros (poucos) o fizeram. Não há nada na minha vida profissional e pessoal que me faça envergonhar. E adorei os cinco anos de pertença aos órgãos sociais de um Clube que, reconheço, jamais será unido. Como não o são grande parte das organizações neste nosso país de medrosos, bufos e invejosos. E digo isto com conhecimento da nossa História. Ora bolas! Sempre foram 285 anos de Inquisição e 48 anos Ditadura. Como também explico aos meus alunos de História e Economia Social, citando David Landes, no seu livro “A riqueza e a pobreza das nações”[3] e outros autores, todos nós temos um ADN cultural que nos propele ou limita.

Cabe a todos, professores, alunos, políticos e restantes cidadãos, identificar aquilo que nos torna diferentes e converter as alegadas falhas de carácter em ferramentas de sucesso: para que o medo se torne prudência e alerta, conectados à alegria em criar e em converter, para melhor; para que a delação se transforme em capacidade de análise crítica e liberdade de opinião e de denúncia (real) de iniquidades; e para que a inveja se reduza a uma vontade de superar os outros (lealmente) e, principalmente, a nós mesmos.

Esta é, quanto a mim, a chave para um país empreendedor. Como será para um Clube como o Sporting que poderá e deverá procurar no seu seio gente que, face a esta falta de união, mantenha uma dinâmica que vem permitindo uma notoriedade de marca e a construção de um conjunto de outros intangíveis, apesar da falta do que muitos sentem, de títulos e maiores sucessos. E que o façam sem medos. Que o Adamastor já lá ficou atrás há muitos anos.

Artigo em Link to Leaders

[1] https://bit.ly/2WF6Op7

[2] https://bit.ly/2W5R7a5

[3] Landes, David S. (2001); “A Riqueza e a Pobreza das Nações – Por que são Algumas tão Ricas e Outras tão Pobres”; Gradiva.

Outras Notícias

2025 | 2026

O ISG |Business & Economics School dispõe de um Serviço de Apoio ao Candidato onde podem ser obtidas informações relacionadas com o teu processo de candidatura à Universidade e esclarecer dúvidas acerca das Condições de Acesso/ ingresso e tipologia de candidatura....

Docentes ISG premeados na DSOTT

O Coordenador da Licenciatura em Gestão do Turismo do ISG, Professor Doutor João Caldeira Heitor, em conjunto com a Presidente do CIGEST, Professora Doutora Mariana Marques receberam a distinção de Melhor Paper apresentado no Congresso Científico DSOTT Diversity &...

Conferência “A Inteligência Artificial e o Futuro da Educação”

A Senhora Administradora do Grupo Ensinus, Dra. Teresa Damásio, irá participar na Conferência “A Inteligência Artificial e o Futuro da Educação”, no próximo dia 7 de julho, pelas 18h30, na Sala do Âmbito Cultural do El Corte Inglés, Piso 6, em Lisboa. Esta conversa em...

Diretor do ISG lança novo livro de crónicas na 95ª Feira do Livro

O Senhor Diretor do Instituto Superior de Gestão, Professor Doutor Miguel Varela, esteve na 95ª edição da Feira do Livro, no dia 15 de junho, para fazer o lançamento do seu novo livro de crónicas que reúne todos os artigos de opinião publicados no Jornal de Negócios...

ISG e Município de Setúbal estabelecem parceria estratégica

O Instituto Superior de Gestão e o Município de Setúbal formalizaram uma parceria institucional que visa reforçar a cooperação nas áreas da educação, formação, investigação e extensão universitária, em alinhamento com a missão e os objetivos de ambas as entidades....

“O Segredo não é complicar, é simplificar”

O Jornal Vida Económica convidou o Docente do ISG e Investigador do CIGEST, Professor Doutor Jorge Vasconcellos e Sá, para uma entrevista sobre simplificar problemas reais do quotidiano e torna-los em oportunidades de negócio. Este foi o ponto referencial para abordar...

ISG recebe Fulbright Specialist da Universidade de Houston

O Instituto Superior de Gestão é a instituição anfitriã da Professora Doutora Consuelo Waight, da Universidade de Houston (EUA), através do Programa Fulbright Portugal. Especialista em desenvolvimento executivo de Recursos Humanos, a Professora Doutora Consuelo Waight...