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TRABALHO E SEU DIREITO

13 de Abril, 2020

No momento difícil em que nos encontramos por efeito do surto Covid19, já nos apercebemos que as dificuldades não se resumirão a problemas de saúde, serão bem mais vastas, de onde se destacam as situações tanto sociais como económicas. Desde logo as sociais, que contrariam a nossa natureza de necessidade de integração numa sociedade e cuja consequência é a maximização das nossas características enquanto seres humanos dotados de toda a sua plenitude, violando os brocardos “ubi homo ibi societas, ubi societas ibi jus e ubi homo ibi jus”.

Vários dos direitos que foram sendo adquiridos progressivamente ao longo dos tempos de um modo universal por toda a população, com primazia para as garantias de liberdade e igualdade social, poderão sofrer algumas mutações às nossas rotinas anteriores, alterando alguns dos nossos hábitos de vida que pareciam totalmente adquiridos e que, inevitavelmente a acontecer, acarretarão alterações profundas no nosso bem-estar e na nossa qualidade de vida com necessariamente um retrocesso grave no processo social de integração entre pessoas e áreas geopolíticas, discussão esta que deixaremos para um artigo ulterior.

A nível económico existirão igualmente vários danos dos dois lados do mercado, alguns deles irreversíveis e onde se enquadram desde logo insolvências, desemprego e queda de rendimentos, que influenciarão novos comportamentos por parte dos principais agentes económicos, empresas e famílias, encontrando-se ambos do mesmo lado da tragédia quanto aos resultados negativos que esta já se encontra a proporcionar.

No entanto, temos assistido a várias intervenções políticas que tentam atenuar os impactos económicos que este surto já se encontra a provocar de modo a garantir a normalidade possível nos mercados, sendo algumas delas relacionadas com os trabalhadores e de onde se destacam os layoff, o teletrabalho, as faltas justificadas para quem tenha filhos até aos 12 anos, a suspensão do limite de trabalho suplementar ou a mobilidade de trabalhadores entre muitas outras, sendo portanto relevante verificar-se num Estado de Direito Democrático com cariz social uma regulação do fator de produção trabalho.

Mas quando se fala de trabalho, a que nos referimos concretamente? Poderá dispor de imediato de vários sentidos, mas de modo simples, é um esforço ou um produto deste mesmo esforço como atividade, função, não exclusivo ao ser humano visto que tanto os animais como as máquinas também desenvolvem um desgaste, existindo nos bens de capital a respectiva amortização.

Contudo, aquele que nos importa para efeitos prioritários de regulação jurídica é o esforço ou o produto do esforço humano, podendo segundo António Monteiro Fernandes definir-se trabalho como a “atividade humana decorrente da aplicação de esforço físico e psíquico tendo em vista a realização de uma finalidade lícita e útil” podendo mesmo aqui o termo usufruir de vários significados.

Todavia e apesar da necessidade de intervenção legislativa nas diversas espécies de disponibilização laboral, com a correspondente padronização de regras de conduta por existir uma conexão social entre duas partes, aquela que oferece maior pertinência relativamente a uma normalização própria é a que se relaciona com um cenário inicial de desequilíbrio entre os dois sujeitos, visto um deles se encontrar em desvantagem, surgindo desta forma um ramo específico denominado direito do trabalho.

Conforme visto, esta esfera de direito não é adscrita a todo o trabalho mas de certo trabalho e nomeadamente aquele que é praticado por pessoas singulares segundo o art. 11º do Código do Trabalho no âmbito de um vínculo social, ou seja, em proveito alheio e de maneira a ocasionar a terceiro uma utilidade já que se for em benefício próprio não existe nenhuma relação nem necessidade de proteção do prestador do trabalho.

Deverá ainda ser praticado com liberdade, com inteira vontade da referida pessoa singular se obrigar através de um contrato individual de trabalho a realizar em conformidade com certas condições legais e contratuais previamente definidas, determinada atividade num âmbito de pessoalidade (liberdade de pessoalmente se obrigar a disponibilizar o seu tempo a outrem), excluindo-se as forçadas ou compelidas que não se enquadrem num compromisso livremente assumido mas que sejam impostas externamente, casos da escravatura ou de alguma obrigatoriedade legislativa ou política como uma requisição civil, trabalho penitenciário ou serviço militar obrigatório.

Mas a tal esforço e consequente produto dai decorrente (algo que provoque uma benesse a terceiro de forma lícita) deverá suceder uma contrapartida como recompensa, não só pela conjunção provocada mas igualmente pelas limitações pessoais, familiares e sociais no cumprimento de um horário e calendário.
Bem como pela subordinação às ordens diretivas e instruções proferidas pelo favorecido deste sacrifício (através de um dever de obediência), até porque a pessoa singular que o realizou encontrar-se-à naturalmente pelas razões indicadas dependente economicamente desse, que decidirá ainda como esta função será concretizada acrescendo portanto aos pressupostos anteriores o trabalho remunerado e subordinado.

Assim, o trabalho gratuito no domínio das relações familiares, de amizade, de caridade ou que não comportem a estatização de subordinação/dependência, não serão alvo de ordenação através deste ramo de direito, que é de cariz privado, afastando igualmente os elos existentes entre funcionários públicos e autoridades públicas onde se insere o “ius imperium” e que dispõe de características diferenciadas.

Em suma, o ramo de direito do trabalho disciplina as relações jurídicas de índole privada relacionadas com a aceitação pessoal e livre de obrigatoriedade na realização de uma atividade útil e lícita em proveito alheio e sob subordinação do seu beneficiário, em troca de uma retribuição enquanto contrapartida destes afinco, disponibilidade e heterodeterminação.

Tem como objetivo principal a proteção da parte que pratica o esforço e limita a sua autonomia individual, que originariamente se encontra debilitada contratualmente num esquema negocial que deveria ser paritário, como em qualquer outro obrigação jurídica de natureza privada, pretendendo deste modo promover um razoável equilíbrio entre empregador e colaborador.

Não devemos todavia confundir esta adequada equidade com igualdade entre ambos os intervenientes numa lógica de justiça comutativa, já que quem corre efetivamente o risco é quem contrata, sendo por tal razão que a própria legislação laboral atribui a possibilidade de subordinação jurídica, ou seja, deverá ser sempre o contratante a decidir a organização e funcionamento da atividade com respeito sim pelas garantias do trabalhador mas sem prejudicar os seus direitos legítimos. Não só porque é a instituição que se constituiu para operar de certa forma, com base num planeamento estratégico ponderado e delineado, com consequentes objetivos estatizados mas igualmente porque é esta que apresentará investimento, produzirá riqueza e capacidade contributiva ou suportará o risco, sendo que, para poder consolidar a sua pretensão, procederá à procura de colaboradores que disponham de um perfil considerado apropriado, de modo a serem enquadrados no conjunto dos seus fatores de produção, compilados com um propósito.

O trabalhador será deste jeito, no âmbito do diagrama do fluxo circular da renda, um dos instrumentos desta engrenagem se usufruir dos atributos procurados, uma peça do puzzle produtivo. Aceita portanto conceder os seus tempo e aptidão produtiva na execução de decisões terceiras, em troca de contrapartidas recompensatórias de realização material (recompensas extrínsecas) e/ou imaterial (recompensas intrínsecas), estando quanto a este em causa a disponibilidade e não o risco ou sequer o resultado.

Artigo da autoria do Professor Doutor Miguel Furtado, Coordenador das formações jurídicas pós-graduadas e professor do ISG

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